Júlia entrou no
vagão um pouco ofegante porque precisara correr para não perder o metrô. Tinha
ficado presa na reunião com o pessoal da loja de calçados onde trabalhava como
vendedora . Chegaria muito tarde em casa e teria que enfrentar as ruas do seu
bairro, que era violento e ficava deserto depois das dez da noite.
Já sentada e
com a respiração voltando ao normal, ela deu uma olhada ao redor e notou que o
vagão ia quase vazio. Isso era bom porque ela poderia ir lendo tranquilamente,
sem ser atrapalhada pelo barulho das pessoas conversando. Tirou da bolsa um
livro, ajeitou os óculos e procurou a parte do romance em que parara na última
leitura. O metrô partiu e ela pôde ler duas páginas até a parada seguinte, onde
desceram poucas pessoas e subiram duas ou três.
Um homem veio
se sentar no banco oposto ao dela, bem a sua frente. Ela o observou rapidamente,
mas não lhe prestou muita atenção. Minutos depois levantou os olhos para ele
porque percebeu que ele a olhava insistentemente. Isso a incomodava. Então,
para intimidá-lo, encarou-o com uma expressão hostil, mas ele sustentou o olhar
e até lhe deu um leve sorriso.
“Cínico!” ela
xingou em pensamento, e baixou os olhos, retornando à leitura como se não desse
a mínima. Que olhasse o quanto quisesse! Estava acostumada com homens
admirando-a. Ela imaginou que aquele uniforme que usava, um conjunto de saia e
blusa verde, devia deixá-la muito sexy. Então olhou para baixo e viu os próprios
seios quase aparecendo no decote. Era uma coisa bonita de se ver, mas um tanto
escandalosa! Ainda não tinha se dado conta do quanto aquele uniforme era
provocante!
O homem
continuava a observá-la. Ela não teria se importado se ele ao menos fosse bonito.
Mas era feio! Não tão feio; ao menos tinha belos braços, musculosos e peludos.
Não estava mal vestido também, mas tinha a barba mal feita e ela não gostava de
homens desleixados que não se importam com a própria aparência.
O que diabos
ele tanto olhava?! Só podia ser um tarado. Ele tinha uma cara de tarado! Ela
morria de medo de tarados. Medo e nojo, pois seu último namorado tinha sido um
tarado. Ela ainda se lembrava da cena com horror: na escadaria do prédio dele,
os dois se beijando; quando ela se deu conta, viu que o pênis dele estava pra
fora das calças, duro e grande. Foi o fim.
Mas a vergonha
mesmo foi quando quis desabafar com uma amiga. Esta quase estourou de dar
risadas da estória. E zombou dizendo que ela era uma histérica, totalmente sem
esperanças. Mas que culpa ela tinha se só atrai canalhas?!
Na metade da
viagem, Júlia notou que o homem parara de olhar pra ela. Ele ia de cabeça
baixa, com uma expressão abobalhada de quem está mergulhado em seus próprios
pensamentos. Parecia ter perdido todo o interesse em admirá-la. Talvez
ela não fosse tão bonita assim como pensava. Por que ele parara de olhar? Ou só
tinha feito aquilo pra provocá-la, só pra atrapalhar sua leitura? E se ela lhe
tivesse dado bola? como ele teria reagido?
Reparando bem,
até que ele era charmoso com aquela barba mal feita e o jeitão de bandido. Ela
podia apostar que se largasse o livro e olhasse pra ele, teria a atenção dele
de volta. Sim, era só ela querer.
E quis. Passou
a encará-lo, mas depois de um minuto viu que ele estava longe dali. Ela parecia
invisível agora pra ele. O idiota não percebia que ela estava dando mole!
E se ela
cruzasse as pernas, o belo par de pernas brancas e roliças que tinha?
Cruzou. Mas ele
não viu. E se ela agora descruzasse as pernas, lentamente, como a assassina
daquele filme famoso?
Foi o que fez,
mas também não funcionou. Melhor era voltar ao livro e esquecer.
Abriu o livro,
porém não conseguiu ler. Tinha metido na cabeça que só ficaria satisfeita
quando ele voltasse a admirá-la, nem que fosse para ignorá-lo depois. Então,
ainda fingindo ler, com a cara enfiada no livro, abriu um pouco as pernas. Ele
continuou na mesma, sem reparar no que ela fazia. Ela abriu as pernas mais um
pouco e percebeu-se sentindo um certo prazer naquilo. Nunca tivera a coragem de
fazer tal coisa antes, mas agora que fazia, descobria o quanto era excitante.
De repente compreendeu por que algumas mulheres gostam de se exibir em
situações parecidas.
Ninguém no
vagão quase vazio notava que ela se expunha daquela forma, nem mesmo o homem a
sua frente. Isso a encorajou a ousar ainda mais. Afastou as pernas até onde a
saia apertada permitia. E como se não bastasse, desejou não estar usando nada
por baixo, como naquele mesmo filme. Como seria ser flagrada assim, sem
calcinha no metrô, com os pelos à amostra? Imaginou aquele homem olhando bem
para o centro de suas pernas. Que visão agradável seria pra ele! Ela sem
calcinha. Ele veria tudo, pois estava bem ali a sua frente, menos de dois
metros. Ele veria os pêlos crespos e talvez algo mais. Ela estaria molhada ali
e ele saberia.
Júlia havia
fechado os olhos por um instante enquanto se perdia no prazer dessa fantasia.
Ao abrir os olhos novamente, tomou um susto porque viu que o homem estava bem
atento agora, com os olhos enfiados no meio de suas pernas escancaradas. Ele
levantou um olho e sorriu maliciosamente pra ela, como se soubesse que ela dava
brecha de propósito. No mesmo instante, ela reagiu e cerrou as pernas,
nervosamente. Acabava de se arrepender do que tinha feito e agora só queria que
o metrô chegasse logo a sua estação para ela poder descer e nunca mais ter que
encarar aquele homem outra vez. Tomada de vergonha, subiu o livro até a cara e
fez de conta que lia, como se nada tivesse acontecido. E assim foi até a hora
de descer do metrô.
Ela deixou a
estação apressada e nem olhou pra trás. Caminhou rápido por uma avenida e
entrou no conjunto habitacional onde morava. Como já havia imaginado, àquela
hora da noite as ruas estavam desertas, as portas das casas fechadas, as pessoas
já dormindo em suas camas ou cochilando diante de uma tv. Depois das dez, era
como se houvesse um toque de recolher no lugar, por causa da violência.
A poucas
quadras de sua rua, Júlia teve a impressão de que alguém a seguia. Quando se
voltou para verificar, quase teve um infarto: o homem do metrô também havia
descido ali e a acompanhava de perto. Ela entrou em pânico. Então
apressou o passo. Teve vontade de correr, mas a saia era justa demais e os
saltos altos não ajudavam. Desesperou-se, pois pelo ruído dos passos dele no
calçamento, julgou que o homem também apressara o ritmo. Não tinha dúvidas de
que era um maníaco. E todas as portas fechadas àquela hora! Aquela rua muito
arborizada era agradável de dia, mas agora de noite era deserta, sombria, esquisita.
O homem
continuava vindo, tranquilamente, como se soubesse que não havia como ela
escapar. Ela pensou em gritar, pedir por socorro enquanto tinha tempo. Mas se
estivesse enganada, que vergonha não passaria! Por um instante, considerou que
talvez fosse apenas uma coincidência, que talvez ele também morasse por ali.
Mas como?! Ela apanhava aquele metro todos os dias e não se lembrava de jamais
tê-lo visto antes.
Não, não
restavam dúvidas: estava sendo perseguida pelo sujeito. Maldita reunião que a fizera
voltar tão tarde! Maldita ela mesma que provocara o homem no metrô! Agora
estava naquela situação, perseguida por um tarado no meio da noite naquela rua
estreita e esquisita. Ia entrar na primeira esquina e, se ele entrasse também,
não teria mais dúvidas: ia gritar. Melhor fazer logo um escândalo do que deixar
que ele a seguisse até sua casa e descobrisse onde ela morava. Ou pior ainda!
Se ele quisesse entrar em sua casa?! Então é que não teria chances mesmo, pois
morava sozinha. Gritaria bem alto se ele dobrasse aquela a esquina ali na
frente depois dela. Ladrão não era porque ladrão não agiria assim com aquela
tranqüilidade toda. Um ladrão já a teria abordado. Era tarado mesmo!
Ela dobrou a
esquina e entrou numa rua ainda mais sombria e deserta. Olhou por sobre o ombro
e quase desmaia ao notar o vulto do homem já muito perto. Ia gritar agora, mas
por algum motivo não teve coragem. Como era medrosa! Continuou andando,
tentando manter a calma, rezando para que estivesse enganada e aquele homem
tomasse outro rumo. Depois de um momento pareceu-lhe que ele estava ficando pra
trás e ela quase relaxou. Porém voltou a ficar tensa quando passava por um
enorme terreno baldio, com um matagal crescendo dentro e algumas passagens pelo
muro em ruínas. Já
tinha ouvido falar que ali uma jovem havia sido estuprada algum tempo atrás.
Aquele homem as suas costas só precisaria correr poucos metros, agarrá-la pelo
pescoço e arrastá-la ali pra dentro. Depois faria o que bem entendesse com ela.
Ninguém veria nada e ela não poderia gritar porque certamente ele lhe taparia a
boca ou lhe faria ameaças com alguma arma. Seria estuprada de qualquer forma,
morta ou viva. “Melhor viva do que morta”, ela pensou e achou que ia chorar,
mas não chorou. A amiga tinha razão: ela era uma histérica e sempre fazia
tempestade em copo d’água. Não era pra se desesperar porque ainda não tinha
acontecido nada e o homem estava longe ainda. Mas nada lhe tirava da cabeça que
ele queria lhe fazer algum mal.
E de repente,
pareceu-lhe que ele apressara o passo de novo. Achou que era agora que ia ser
atacada. Se visse alguém chamaria por socorro, mas não havia ninguém! Somente
ela e ele. Andou mais rápido também, mas já estava quase conformada com sua
desgraça. Ia ser estuprada e não tinha como evitar. Dessa vez tinha certeza de
que não exagerava, pois era coincidência demais que aquele homem que ela
provocara no metrô a tivesse acompanhado até ali.
Novamente olhou
para o matagal escuro dentro do muro esburacado. Ele a levária ali para dentro,
provavelmente a amarraria. Depois arrancaria suas roupas e abusaria dela. Mas o
mais importante era que ele não a machucasse, que não lhe fizesse um mal pior.
Era bom que ela se preparasse e não fizesse bobagem na hora. Seria bem prática
e não desgostaria o homem para ao menos sair viva daquela situação. Faria o que
ele mandasse. Ou talvez nem tudo, pois tinha uma coisa que não faria nem morta:
chupar o pênis dele. Se ele a obrigasse a chupá-lo, ela o morderia com toda
força e depois fugiria. Não ia chupar nenhum pau imundo! Ele que não tivesse a
idéia!...mas pensando melhor, se o mordesse e não conseguisse fugir, sem dúvida
ele a mataria. E se ele tivesse um revólver?! Não dava pra morder e fugir com
um revolver apontado pra cabeça. Levava um tiro na hora! Seria idiotice! O
jeito era obedecer e não desagradar o bandido. Imploraria pra não chupar, mas
se ele insistisse, acabava chupando. É, ia chupar, sim. Pra salvar sua vida ela
faria tudo. Não valia a pena arriscar. E depois, talvez se o chupasse e ele se
satisfizesse logo, vai que nem a estuprava depois! Seria muita sorte, mas
coisas assim podem acontecer. Talvez isso a salvasse! Seria até bom que ele
pedisse para ela chupar, pois faria de um jeito que ele gozaria logo e a
deixaria em paz. Mas
não... ele não ia cair nessa. E tarados não ficam satisfeitos assim tão fácil;
do contrário não se chamariam tarados. Ele a obrigaria a chupar de qualquer
forma e em seguida a violentaria sem piedade. Ia ser doloroso porque ele a
penetraria contra a vontade dela, sem lubrificação, sem ela estar excitada.
Não se lembrava
onde lera uma vez que algumas vítimas de estupro ficam excitadas no momento em
que são penetradas, não por apreciarem tal violência, pois nenhuma mulher
normal apreciaria; ficam excitadas espontaneamente, sem quererem, como uma
reação instintiva e primitiva, pois as fêmeas ancestrais da espécie humana eram
estupradas pelos machos e essa era a pratica comum entre os primeiros seres
humanos. Deve ter lido isso num artigo científico. Mas é difícil de crer que
uma mulher fique excitada com tal barbaridade, embora existam muitos fatos
surpreendentes nesse mundo. Será que ela seria uma dessas mulheres de instintos
primitivos?! Se ficasse excitada, mesmo sem querer, talvez não sofresse tanto.
Se o pênis dele fosse grande demais, era preferível ficar excitada;
lubrificada, não sentiria tanta dor. Mas o pior é que ele poderia não se
contentar só com isso! Estupradores costumam ser sádicos e extremamente
depravados. Iria tentar enrabá-la também. Isso ela não podia permitir. Tudo
menos passar por uma coisa dessas! Mas o que uma mulher pode fazer numa hora
dessas?! Não adiantaria lutar, pois ele a dominaria fácil, iria obrigá-la a se
deitar de bruços no chão e em seguida a penetraria daquela forma, sem que ela
pudesse fazer nada. Já tinha visto muitas dessas cenas horríveis no cinema e
agora ia acontecer com ela de verdade!
Era melhor nem
pensar a respeito! Aquela moça que havia sido estuprada bem ali naquele
matagal...tinha passado por aquilo, coitada! O maníaco tinha praticado as
piores depravações com ela. Violentou-a mais de uma vez, na frente e atrás, sem
se comover com choro ou apelos, deitado com ela no chão. Ela até imaginava o
sofrimento que a pobrezinha havia experimentado. Um pênis duro entrando a força
num lugar onde mal cabe seu dedo, arrebentando você toda, e repetindo isso
varias vezes. Tarados são sádicos. Sentem prazer em ver você chorar e implorar
para que eles parem, mas não param, pois adoram isso.
A própria moça
havia descrito aquele seu horror. Mas ao menos ela havia saído viva pra contar!
Era o que Júlia esperava que também acontecesse com ela: não ser morta depois
de estuprada. Que ele fizesse tudo, mas ao menos a deixasse viva.
Todos esses
pensamentos passavam velozes pela cabeça de Júlia enquanto ela caminhava com
passos apressados.
Estava perto de
casa, mas não queria que ele soubesse onde ela morava. Então não pensou duas
vezes e entrou no primeiro beco que viu do outro lado da rua, em frente ao
terreno baldio.
Tinha lhe
parecido que era a melhor solução, que poderia escapar por ali, mas ao entrar
no beco, arrependeu-se. Quanto azar! Tinha esquecido que aquele beco havia sido
fechado semanas atrás. Estava presa ali, entre o enorme muro de uma escola e um
armazém. E era um beco tão pequeno e estreito! Não podia ter se metido num
lugar pior! Agora é que se complicara mesmo porque não dava mais tempo de
voltar.
Com o coração
aos pulos, ela espremeu-se contra a parede e esperou, não tendo mais o que
fazer exceto rezar pelo milagre de o homem não a descobrir ali. Quantos erros
cometidos num só dia! E essa última idéia de se meter naquele buraco tinha sido
o fim da picada! Até parecia que...
Júlia ouviu os
passos do homem muito perto. Fechou os olhos apavorada. Pediu a Deus que
tivesse um desmaio imediatamente, pois assim não veria nada, não sentiria nada,
não sofreria nas mãos do estuprador. Então, quando enfim ela ouviu que ele
pisava já na entrada do beco, olhou de canto de olho e, aterrorizada, viu seu
perseguidor. Ali estava ele, o mesmo homem que ela provocara no metrô. Era ele,
mas...como podia ser?! Ele havia passado reto?! não a atacou como ela havia
temido o tempo todo?! Não;pelo contrario! Ele passou e apenas deu um leve
sorriso pra ela, quase como se zombasse de ela estar metida naquele lugar daquele
jeito, e seguiu seu caminho pacificamente.
Júlia saiu do
beco e viu que ele se afastava sem olhar pra trás. Agora ele lhe parecia ser um
homem comum, sem nenhum interesse em estuprar mulheres. Ela estava muito
confusa, pois há um minuto atrás tinha certeza de que estava sendo perseguida
por um tarado. Não queria acreditar que tudo tivesse sido apenas uma
coincidência, que aquele homem que ela provocara no metrô fosse talvez apenas
um morador novo do bairro! E no entanto, o homem já havia dobrado a esquina no
fim da rua e sumido.
Recuperando-se
do susto, ela riu de si mesma. Mais uma vez ficara histérica e fizera uma
confusão em sua cabeça louca. Sentiu-se esquisita porque, se por um lado estava
aliviada por não ter sido violentada, por outro não suportava a sensação de ter
sido tola, de ter se angustiado tanto por nada. Era tão exagerada! E aquele
homem passou sem demonstrar o menor interesse por ela! Era o que ela ganhava
por dar bola a um sujeito como aquele, que ainda por cima era feio! Aquele
mesmo que não era estuprador coisa alguma! Se duvidar, era até gay...e só
serviu pra atrapalhar sua leitura!
Fim
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